Cio da terra
No início da última dezena de março temos, no hemisfério sul, o equinócio de outono. A palavra equinócio [Do latim: aequinoctiu = noite igual; aequale = igual + nocte = noite] indica que o Sol estará posicionado em seu ponto médio de deslocamento. Os extremos de deslocamento desta estrela é o que denominados de solstício [Do latim: solstitiu = Sol Parado], por isso temos solstício de Verão e solstício de Inverno.
O verão, em algumas tradições nativas norte-americanas, é associado ao elemento água. É o período de máxima produção de energia. Poderíamos dizer que é o momento em que os frutos são colhidos. Para exemplificar isto, basta considerarmos que é durante o verão que o carnaval ocorre no Brasil – as pessoas saem às ruas para dançar, cantar, namorar. Ainda, o verão nos remete ao passado a atua mais diretamente no nosso campo emocional. Signos de água – peixes, câncer e escorpião – estão particularmente propensos a sentirem as “águas mais quentes”, um fervilhar de emoções e sentimentos.
Pois bem, caminhamos agora em direção ao outono e, com isso, os elementos se reajustam. O outono marca o período das últimas colheitas. Podemos lembrar-nos do milho – alimento, aliás, muito importante para diversas sociedades americanas. Momento de recolher os frutos de nossos esforços que amadureceram no verão. O elemento terra assume especial destaque. Na agricultura biodinâmica, por exemplo, é o momento de produzir o preparado que concentra forças interiorizadas pela terra – literalmente enterra-se esterco guardado dentro de um chifre de vaca que tenha dado cria durante a vida. Isto é feito no equinócio de outono e retirado da terra no equinócio de primavera. Durante os meses de março a setembro estará se trabalhando as forças interiores da terra para que possamos plantar na primavera.
O outono está relacionado à direção Oeste. Fica fácil entender que o pôr do sol simboliza exatamente esta interiorização – é como se ele adentrasse também a terra para renascer na direção leste na próxima aurora. O Oeste nos convida a refletir sobre nossas últimas colheitas e para qual caminho devemos seguir. O que temos plantado e o que desejamos colher são perguntas próprias desses tempos de outono.
Se nos atentarmos para o que está a nossa volta e, como no yoga, observarmos com mais cuidado as ressonâncias das naturezas externas com nossas naturezas interiores - os caminhos dos ritmos que pulsam por entre nós e correntezas – quem sabe não nos aproximemos um pouco para, como disse o poeta, “afagar a terra, conhecer os desejos da terra, cio da terra a propícia estação e fecundar o chão”.
Raphael Rodrigues é antropólogo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário