sábado, 3 de agosto de 2013

Durante a Antiguidade e a Idade Média os surdos não eram considerados seres humanos

PSICANALISE NÃO VERBAL/3
Durante a Antiguidade e a Idade Média os surdos não eram considerados seres humanos competentes.
Essa idéia era decorrente do pressuposto aristotélico de que o pensamento não podia se desenvolver sem linguagem e que esta não se desenvolvia sem fala. A comunicação através de conceitos era reconhecida como uma forma privilegiada de manifestação da inteligência e, esta, só seria manifestada a partir da fala. Assim, quem não ouvia e não falava oralmente também não pensava. Sem estas condições inerentes à inteligibilidade humana e considerados como isentos de processar as faculdades mentais, os surdos, eram vistos como “imbecis”, sendo-lhes negado os direitos: legais, isto é, não podiam fazer testamentos e necessitavam de curadores para os negócios que herdavam; religiosos, pois acreditava-se que as almas dos surdos não podiam ser imortais, porque eles não podiam falar os sacramentos; educacionais, pelo fato de que os surdos, sendo vistos como sujeitos desprovidos de razão e de lógica de pensamento eram considerados também como indivíduos desprovidos da capacidade de apreenderem a educação; afetivos, pois não podiam se casar para evitar a reprodução, entre outros.
Havia uma crença que a única forma de cura da surdez era através de milagres conforme mostra a Bíblia em uma passagem do evangelho de São Marcos (7:31) “... trouxeram um homem surdo e com um impedimento da fala e suas faculdades de ouvir foram abertas e o impedimento de sua língua foi desatado e começou a falar normalmente”. Então, somente através do milagre divino o surdo seria humanizado.
Os sinais não eram considerados como língua, mas como gestos primitivos. No final da Idade Média com o rompimento do isolamento feudal teve início o intercâmbio com vários povos, resultando no encontro de surdos e na formação de comunidades de surdos e, conseqüentemente, no desenvolvimento da língua de sinais. A limitação inicial no relacionamento dos surdos entre si era decorrente, entre outras, de suas características lingüísticas diferenciadas, associadas ao isolamento a que se viam relegados, em relação à sociedade. Estas condições apresentaram considerações relevantes no processo de constituição cultural e linguística das comunidades surdas. A primeira delas e, sem dúvida, a mais singular é a criação de um instrumento comum de comunicação, ou seja, a criação de uma nova língua – a língua de sinais.


A segunda, até certo ponto determinante na construção da identidade cultural das comunidades surdas, foi aquela que englobou a adaptação do surdo a sua peculiaridade, explorando os recursos disponíveis, destinados a sua sobrevivência. Essas situações novas exigiram, entre outras, a criação de uma organização social que mobilizaram todas as forças do grupo, em busca de solução para um projeto que se tornou coletivo. Essas diferenças foram estimuladoras da criatividade, da socialização de saberes, permitindo o acúmulo de avanços, no interior de um universo isolado. Entretanto, essas trocas culturais exigiram adaptações, a partir do tipo de organização trazida como bagagem cultural, com uma cultura já estabelecida e dominante na sociedade – a cultura ouvinte. Em outras palavras, as diferenças lingüístico-culturais que marcaram os surdos em relação aos ouvintes, permitiram aos mesmos um acervo comum de conhecimentos que, os levaram a uma adaptação na sociedade, sem perder de vista suas características próprias. As diferenças do ambiente, do qual procediam ao acervo comum de conhecimentos, possibilitou a articulação de elementos diferentes, que se combinaram numa espécie de síntese, para a qual convergiram as características próprias dos surdos, mobilizando forças em favor da cooperação, de atitudes comunitárias, de ajuda mútua, da solidariedade e do fortalecimento recíproco. Foi um período fecundo de construção interna, na qual muitos dos elementos da cultura tradicional (ouvinte) não se revelaram adequados às condições que foram se estabelecendo na cultura surda, havendo, pois, a necessidade de serem criados outros, para substituí-los, ao lado daqueles que foram mantidos.

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